O trabalho do Probacionista, e a mudança consciencial
Quando assinamos o juramento como Probacionistas da Santa Ordem, a primeira ideia que temos é: “enfim tornei-me um membro da Astrum Argentum”! Esse é um dos primeiros enganos de nossa caminhada, e haverá muitos outros, “pois o ordálio da iniciação não é leve”.
Uma das primeiras coisas que é preciso esclarecer é que o período de estudante é apenas para equalizar os conceitos básicos necessários para que o aspirante possa entender o linguajar falado por seu futuro instrutor, e não precise de esclarecimentos quanto a conceitos básicos a qualquer estudante de ocultismo.
No entanto, o trabalho como Probacionista tem uma natureza diferente: é o primeiro grau onde se passa por uma transformação consciencial necessária para alcançar um novo plano existencial. Afinal, o Probacionista ainda não é oficialmente membro da Santa Ordem, pois ainda não alcançou o primeiro grau, que se situa em Malkhut, a primeira Sephira. Ele ainda precisa vencer a força gravitacional que o puxa para baixo, em direção ao caos de onde tenta se livrar, as qliphots. Em outra tradição esse é o chamado Homem da Torrente, que precisa se transformar em Homem de Desejo. Aqui é o Probacionista que precisa se transformar no Neófito. No gnosticismo esse é o homem que passa pelo processo de metanóia. Portanto, fica claro que essa transformação consciencial não é compreendida como necessária apenas na Santa Ordem, mas em todos os caminhos que buscam uma transformação do homem.
O ponto principal desse grau é a probação, e não foi à toa que Mestre Therion coloca já no juramento que “o ordálio da iniciação não é leve”. Então, o Probacionista será testado em sua disciplina com qualquer prática que escolha, pois esse é o ponto básico para quem quer seguir adiante na prática mágica: disciplina. Se não consegue ter domínio sobre si mesmo, como quer dominar o mundo ao seu redor?
De acordo com a física, é necessário um gasto maior de energia para sair da inércia do que para manter um movimento. O mesmo ocorre no trabalho iniciático, onde os primeiros passos são os mais árduos, aparentemente, pois é contra a natureza do ser humano que muitas vezes preferem permanecer na zona de conforto, mesmo que muitas vezes dolorosa, já que faz parte do mundo conhecido por aquela pessoa.
E é justamente aí que entra a tão necessária transformação consciencial, que faz parte da consecução que precisa ser alcançada pelo Probacionista.
Como é possível sair da zona de conforto, daquilo que é conhecido, se não há uma mudança de perspectiva sobre aquilo que se almeja? O conceito gnóstico de metanóia nomeia justamente esse processo; mas dentro da visão thelêmica essa mudança se dá quando se compreende determinados conceitos que estão em textos como “O Dever” e “Passando do Velho ao Novo Aeon”. Além disso, a leitura e meditação sobre Liber LXV e a prática diária de Liber Resh contribuem substancialmente para isso.
Marcelo Motta, em uma de suas palestras cujo áudio foi divulgado na internet, quando perguntado sobre a prática do banimento, é bem enfático sobre isso: “Se você tem que banir, é porque o mundo não está girando suficientemente rápido”, e isso é conquistado através da prática diária de Liber Resh, e da afirmação da Vontade, pois ambos colocam o Probacionista sob a perspectiva correta de seu local no universo.
Essa perspectiva correta leva à citada mudança consciencial e, ao mais importante, a compreensão da natureza dos poderes de seu ser. E só então o Probacionista estará pronto para o neofitado.
Algumas pessoas acham que a pergunta sobre a natureza e os poderes de seu ser é simples burocracia a ser seguida quando da passagem de um Probacionista ao grau de Neófito, mas quem entende e passou pelo processo sabe o quão importante é que o Probacionista realmente tenha vivenciado essa transformação, pois seu futuro caminho depende disso. E uma coisa é certa: não tem como enganar o instrutor experiente sobre isso, pois há sinais claros de que a pessoa passou ou não pelo processo. Portanto, saber a resposta à pergunta, não quer dizer nada, pois a vivência é o que vale.
Já vi pelo caminho muitos Probacionistas que falam sobre o Sagrado Anjo Guardião, a prática de técnicas mágicas avançadas, que ensinam sobre Thelema, explicam o Livro da Lei e outros livros sagrados, mas que nunca sequer compreenderam a natureza desse processo de transformação. E esses são focos de pestilência, pois não trabalham sobre si mesmos, mas o ego os faz agir como se fossem mestres experientes no caminho da iniciação.
O trabalho do Probacionista, portanto, é simples, mas não quer dizer que seja fácil. Porém, a dica é não o transformar em algo mais difícil do que realmente é. O foco deve ser perseguido com afinco, pois dispersão é o maior perigo aqui.
Então a primeira consecução do Probacionista é ultrapassar esse primeiro véu, que separa o caos do mundo organizado (as qliphot das sephirot) através dessa mudança consciencial que lhe levará ao status de Neófito e todas as responsabilidades inerentes à essa nova etapa do caminho.
Conheço Probacionistas que ficaram muitos anos nessa etapa, e eu mesmo fui um deles, e na maioria das vezes o caso é uma dentre duas possibilidades: falta de disciplina combinada com dispersão, ou a capacidade que temos de tornar mais complicado algo que em sua essência é simples. Se você se encontra nessa situação, uma reflexão honesta lhe trará bons insights e fará com que seu trabalho flua mais tranquilamente. E se alguma dúvida surgir a suprema dica é: releia seu juramento, quantas vezes for necessário, e várias vezes ao longo do caminho!
Frater Jupiter 1=10
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